Teste genético para autismo: a história vista pela ótica das mães
O autismo é um transtorno complexo que muitas vezes não tem uma causa claramente discernível. Em alguns casos, no entanto, uma pessoa possui uma variante genética que é um fator de risco conhecido para o autismo. O teste genético pode revelar esses fatores de risco.
Mas, como os resultados desses testes nem sempre apontam para um tratamento, para que servem essas informações?
Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos (Reiff et al. 2015) revelou que 60% dos pais cujos filhos realizaram testes genéticos para autismo consideraram a informação útil. Os pesquisadores entrevistaram 50 pais, um por família, que tiveram seus filhos testados. Os resultados nas 50 famílias revelaram que 15 crianças possuiam um fator de risco genético já relacionado ao autismo, 17 descobriram que seu filho tem uma variante de significância clínica pouco clara (VUS, do inglês variant of unknown significance) e 18 não obtiveram informação sobre qualquer risco genético.
Como era de se esperar, os pais que obtiveram por resultado uma variante de risco eram os mais propensos a achar o teste útil. Para muitos com resultados definitivos e alguns com VUS, os resultados do teste forneceram uma explicação etiológica, fazendo os pais se sentirem confortados por finalmente ter uma explicação para os problemas de seus filhos. Vários pais relataram que a descoberta de uma variante genética aliviou seus sentimentos de culpa de que eles poderiam ter feito algo para causar a condição de seus filhos. Vários participantes discutiram o valor de ter um nome ou rótulo associado a um distúrbio genético. Alguns pais notaram que ter um nome forneceu uma identificação mais tangível do distúrbio do filho. Alguns relataram usar as informações para explicar o comportamento da criança a outras pessoas, como médicos, professores, cuidadores e parentes.Alguns pais relataram obter uma melhor compreensão dos pontos fortes e fracos de seu filho e desenvolver expectativas mais realistas para a criança, o que lhes permitiu apreciar pequenos incrementos de progresso e calibrar melhor as intervenções.
No Brasil ainda é incipiente o montante de pessoas com autismo que são submetidas a testes genéticos. No entanto, também temos histórias de famílias perseverantes que obtiveram o diagnóstico molecular de seus filhos. O Progene publicará uma série de artigos contando um pouco da história de famílias que obtiveram o diagnóstico de suas crianças por meio de testes genéticos. A primeira conta história de Claudia e sua filha Isabela que obteve diagnóstico por meio de teste conhecido como array-CGH ou microarranjo genômico.
“Nossa filha apresentou atraso no desenvolvimento global já no primeiro ano de vida. Para o pediatra, cada criança tem seu tempo para se desenvolver, mas os familiares experientes com seus filhos nos alertaram. Fomos buscar segunda e terceira opiniões… Assim marcamos com vários especialistas tanto médicos como terapeutas também. Neste processo de entrevistas foram observados sinais de TEA. Foram anos buscando esclarecer o diagnóstico, que se confirmou com o exame genético da Isabela e dos pais.
O exame identificou uma alteração genética rara, conhecida na literatura cientifica. Conhecer o diagnóstico genético foi um choque emocional no início, mas com ele tivemos um divisor importante. Encontramos outras famílias com o mesmo diagnóstico, e ajustamos todo o tratamento de terapias e exames de acompanhamento. Isto nos trouxe um alivio, passamos a cuidar dela muito melhor, conhecendo então as caraterísticas e riscos associadas à Sindrome de PhelanMcDermid, que está associada ao TEA.
Fomos a inúmeras conferências com pais e pesquisadores fora do Brasil. Um aprendizado incrível que me motivou então a ajudar as famílias brasileiras na mesma situação.
Em todos estes anos, como mãe, me aprofundei nos temas de genética, TEA e da síndrome, participando de encontros científicos com especialistas e lendo artigos publicados. Este envolvimento reforça ainda mais meu sentimento de que conhecer a alteração genética, através de exames, me colocará diante dos tratamentos para minha filha.
Em conclusão sempre que alguma família me pergunta se compensa fazer os exames genéticos, pois algumas vezes os médicos que a acompanham acham que pode esperar, eu digo: se puder investir faça-o. Mesmo que num primeiro momento o achado genético possa ser pouco conhecido, como foi o nosso anos atrás, vale a pena. Um certo desbravamento está sendo necessário para nós, mas como pais muito mais tranquilos do caminho e do que realmente oferecer a nossa querida Isabela. “ (depoimento de Claudia Spadoni– pedagoga, pós-graduada em marketing e comércio exterior e colaboradora da associação de amigos e familiares da síndrome de Phelan-McDermid *).
O teste abordado nesse artigo, conhecido como array-CGH ou microarranjo genômico, identifica perdas (microdeleções) e ganhos (microduplicações) de material genético. As chamadas variações no número de cópias ou CNVS (do inglês copy number variations) ocorrem em muitos casos de autismo. Este teste é recomendado pelo American College of Medical Genetics and Genomics (ACMG) como primeira linha de investigação para autismo, atraso no desenvolvimento e deficiência intelectual (Shaeffer et al. 2013). Nos futuros artigos abordaremos outros casos de investigação genética para autismo.
Referências:Reiff, M., Giarelli, E., Bernhardt, B. A., Easley, E., Spinner, N. B., Sankar, P. L., & Mulchandani, S. (2015). Parents’ perceptions of the usefulness of chromosomal microarray analysis for children with autism spectrum disorders. Journal of autism and developmental disorders, 45(10), 3262-3275.Schaefer, G. B., & Mendelsohn, N. J. (2013). Clinical genetics evaluation in identifying the etiology of autism spectrum disorders: 2013 guideline revisions. Genetics in Medicine, 15(5), 399.Associação de amigos associação de amigos e familiares da síndrome de Phelan-McDermidhttps://www.phelanmcdermidbrasil.com/